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domingo, 11 de setembro de 2011

Qual é o ponto?

A única coisa que percebo, a princípio, é o barulho engraçado das solas dos meus All Stars gastos contra o chão – tap, tap, tap, tap. Meus pés escolhem esses caminhos sem me perguntar. E esse ritmo também, na verdade. Eles sentem a urgência antes que eu mesma tenha tido tempo de processá-la. Eles correm e não ligam se eu tenho dificuldade para acompanhar, desde que acompanhe.

Geralmente eu perco a conta de quantas vezes foi por um triz. De quantas vezes desviei na última hora porque me precipitei, ou de quantas vezes aquele momento de hesitação teve que ser compensado com mais urgência do que meus pés já tinham assumido. Esses pequenos momentos de risco, de quase, sempre me fazem questionar se o resultado compensa isso tudo.

Minhas pernas sempre reclamam. Minha barriga também. Inevitavelmente eu respiro pela boca – gente com os sinos nasais afetados precisando de mais oxigênio vai invariavelmente apelar pra esse recurso – e aquela dorzinha na lateral da barriga sempre vem me fazer companhia, dando um alô a cada inspiração.

Isso sem falar na figura ridícula que eu faço. Aquela mochila enorme e pesada balançando às costas, me fazendo desengonçada e me atrasando. A calça caindo, quase sempre, me deixando praticamente nua – talvez nem tanto, tudo bem, mas a sensação é de total exposição -, e o único jeito que tenho de evitar isso é aumentando o ridículo da minha situação e correndo enquanto seguro a calça.

Aí aparece aquele buraco ordinário – aquele, que sempre aparece enquanto a gente corre e tudo a nosso redor é um mero borrão – e eu afundo meu pé com tudo. Estico os braços como um pássaro para tentar recuperar o equilíbrio, mandando a calça – e tudo o mais - às favas. E aquele momento em que meu coração resolve parar, em que meu corpo fica suspenso no ar, aquele é um momento em que dá pra achar um pouco de paz. Enquanto meu corpo cai – lá vem o clichê – em câmera lenta e descreve um arco, tão gracioso quanto possível com uma mochilona nas costas, no ar, eu sei que não há nada que eu possa fazer a respeito disso. Deixo para a inércia e para a gravidade a tarefa tão urgente de me impulsionar adiante e aproveito a sensação de quase vôo, de liberdade. De paz.

Mas cedo demais meus pés tocam o chão de novo – as solas dos tênis fazendo taps particularmente altos – e meus pés retomam o controle, correndo com ainda mais urgência, a despeito da dor insistente na minha barriga, da queimação no meu nariz por causa do ar seco demais, das reclamações das minhas pernas de que já basta de correr, da mochila balançando pra cá e pra lá nas costas, da calça caindo, da dor do tornozelo machucado pelo buraco ordinário. Apesar de desejar com todas as forças voltar para aquela sensação libertadora, ou pelo menos parar de correr, apesar de odiar tudo o que se relaciona àquela atividade dolorosa para o meu corpo e minha moral, apesar de mal me lembrar de quando e por que eu comecei com aquilo, eu continuo correndo, guiada pelos meus pés, que, naquele momento, sabem mais do que eu.

Quando finalmente chego no meu ponto, não há sensação de alegria, nem de vitória, nem de ter conseguido vencer uma etapa. Só o alívio de ter parado, o consolo barato de saber que fiz apenas o necessário para ter um pouco de conforto que não era assim tão necessário, uma necessidade louca de descansar e a pergunta ainda mais ordinária que aquele buraco: será que valeu a pena?

Às vezes tenho a impressão de que estou constantemente correndo pra pegar ônibus, e eu não podia muito bem ir andando?

Um comentário:

  1. hey minha filosofa favorita! saudades de vc!!!! quando eu voltar pra bh agente tem q marcar de sair! mil coisas pra contar!

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